As trocas de criptomoedas e o imposto de renda

Por Ana Helena Morello Teixeira

Cada vez mais presentes nos mais diversos tipos de transação, as criptomoedas têm vivenciado uma enorme volatilidade nos últimos meses, muitas em queda intensa. O bitcoin, por exemplo, atingiu o menor nível desde dezembro de 2020, chegando a US$ 25 mil, uma redução de quase 20% do valor nos últimos cinco dias de negociação e de 45% no acumulado do ano. 

Essa rápida evolução das criptomoedas e sua volatilidade trazem questionamentos sobre o futuro desses ativos, mais especificamente sobre como ficarão as relações tributárias diante do surgimento de novas tecnologias.

Fato é que as transformações do mundo real, como o uso mais frequente de criptomoedas, avançam muito rapidamente e deixam as regras tributárias obsoletas. Como podemos adequar as normas existentes com as novidades antes futurísticas e agora reais em nossas vidas?
A moeda brasileira é o Real (Lei nº 9.069/95), de forma que as criptomoedas não podem ser usadas como moeda em nossas transações. Essa é uma limitação legal. As criptomoedas, assim como o Dólar e o Euro, podem ser mensuradas a partir do Real, mas com ele não se confundem.

No último dia 26 de abril, o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei No. 4.401, mais conhecido como o Marco Regulatório das Criptomoedas, que deve agora ser reavaliado pela Câmara dos Deputados. Pelo marco regulatório, criptomoedas são ativos virtuais, definidos como a representação digital de valor que pode ser negociada ou transferida por meios eletrônicos e utilizada para a realização de pagamentos ou com o propósito de investimento.

Mas a natureza jurídica das criptomoedas ainda está em discussão: a Receita Federal do Brasil (RFB), por exemplo, definiu criptomoeda como um ativo financeiro, possível de ser transacionado, mesmo conceito com o qual define as ações. E, a partir dessa interpretação, aplica as regras tributárias.

De um lado, temos uma limitação legal/regulatória. De outro, uma interpretação das autoridades fiscais, corroborada pelo texto do PL 4.401, de que seria possível usar a criptomoeda como um ativo financeiro, em transações. O que, afinal, poderemos considerar? Vamos poder usar criptomoedas, e estar sujeito às regras tributárias? Ou criptomoedas serão somente uma base de referência, assim como moedas estrangeiras? A resposta vai além da pretensão da Receita Federal em tributar.

A propriedade da criptomoeda, per se, não deve ser objeto de tributação, afinal ela é um bem. Valores superiores a R$ 5 mil investidos em criptomoedas (como qualquer bem) devem ser declarados ao Fisco na ficha “Bens e direitos” da declaração de imposto de renda, constituindo uma parcela do patrimônio do contribuinte. E, como qualquer bem, quando da alienação, com sua troca por moeda nacional (real), deve-se avaliar se houve ou não ganho de capital – comparando-se o valor da compra e valor da venda. Imposto de renda incide quando há ganho nessas vendas, como qualquer bem.

E nas trocas de uma criptomoeda por outra, haveria aplicação do imposto de renda?

Na Solução de Consulta COSIT nº 214/21, a Receita Federal interpreta a permuta de criptomoedas como hipótese de incidência de imposto de renda. É uma confusão de conceitos. Permuta, sem torna, não representa ganho e, portanto, não se verifica hipótese de incidência do imposto. Somente quando a criptomoeda for convertida em Reais e o ganho for verificado, o imposto seria devido.

O racional está no fato de as criptomoedas não serem tratadas como moedas, apesar de serem utilizadas e muitas vezes denominadas como tal. Como ativo financeiro (ou virtual), as criptomoedas devem ser tributadas se, e somente, quando sua alienação ocorrer com realização em renda (moeda), ocasião em que o seu proprietário estará sujeito à verificação de ganho de capital na hipótese e ao recolhimento de imposto de renda sobre o respectivo ganho.

A aplicação das regras tributárias a uma tecnologia tão surpreendentemente rápida como as criptomoedas é um desafio para todos nós. As discussões são válidas e importantes para acompanhar os desdobramentos das novas tecnologias e os efeitos das aplicações do direito pré-existente.

Por enquanto, atenção aos exageros.

Ana Helena Morello Teixeira é advogada com experiência em consultoria fiscal e contencioso administrativo e judicial tributário, integrante do Mattos Filho Advogados, em São Paulo/SP.

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