Como analisar a saúde financeira de uma empresa

Por Nino Reppucci

Em finanças e nos investimentos, saber analisar a saúde financeira de uma empresa pode ser a diferença entre fazer um bom ou mau negócio. Esse conhecimento é útil tanto na hora de comprar um apartamento na planta de uma construtora, como quando consideramos aceitar a oferta do assessor financeiro sobre um CDB, LCI, LCA, CRA etc. que paga juros altíssimos.

Imaginemos o seguinte: você pretende comprar uma aplicação financeira de renda fixa, cujo principal e juros serão pagos ao final de 12 meses. Como analisar, sucintamente, se o emissor dessa dívida terá condições de honrar os pagamentos prometidos?

Como todos sabemos, quando uma empresa não paga as suas dívidas ela “quebra”. E quando ela “quebra”, os seus credores ficam, na esmagadora maioria das vezes, a ver navios, isto é, perdem. No caso das aplicações financeiras, várias delas possuem garantia do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), mas não é isso que nos interessa aqui.

Para diminuir as chances de perder dinheiro, é de suma importante saber analisar se a empresa terá condições de honrar suas dívidas. As dívidas de uma empresa podem ser divididas em duas categorias:

  1. Dívidas de curto prazo: aquelas que vencem nos próximos 12 meses.
  2. Dívidas de longo prazo: aquelas que vencem depois de 12 meses.

No nosso exemplo, vamos analisar as dívidas de curto prazo. Nada impediria de analisarmos prazo superior a 12 meses, pois o conceito é o mesmo. Para darmos um banho de claridade sobre o que estamos falando, consideremos os balanços de duas empresas diferentes: empresa A e empresa B.

Na ciência da contabilidade existem diversos indicadores de liquidez. Alto lá! O que é um indicador de liquidez? É um índice que mostra se uma empresa tem ou terá condições de pagar as suas obrigações nos prazos previstos.

Vamos relembrar que estamos analisando se uma empresa poderá pagar uma dívida emitida por ela com vencimento em 12 meses. Pela legislação contábil, o prazo de até 12 meses é considerado como curto prazo.

O índice de liquidez mais comum é o chamado Índice de Liquidez Corrente.

Ativo circulante é tudo aquilo que a empresa possui em bens e direitos que podem ser transformados em dinheiro em até 12 meses, como, por exemplo, aplicações financeiras, dinheiro em caixa, estoques, contas a receber etc. Passivo circulante, por sua vez, é o conjunto de todas as obrigações que a empresa necessitará honrar nos próximos 12 meses, como contas a pagar, salários, impostos, empréstimos etc.

Portanto, o resultado da divisão entre o Ativo Circulante e o Passivo Circulante nos permite quantificar o seu grau de liquidez. Usemos os dados dos balanços das empresas A e B para podermos interpretar os números.

ILQ → Índice de Liquidez Corrente.

AC → Ativo Circulante.

PC → Passivo Circulante.

A leitura dos índices é a seguinte:

Empresa A: Para cada R$ 1,00 de passivo a vencer nos próximos 12 meses, ela tem R$ 1,61 de ativos que são ou poderão se tomar dinheiro também nos próximos 12 meses.

Empresa B: Para cada R$ 1,00 de passivo a vencer nos próximos 12 meses, ela tem R$ 0,75 de ativos que são ou poderão se tomar dinheiro também nos próximos 12 meses.

Pergunta a ser respondida: Qual das duas empresas possui uma situação de liquidez mais confortável? A resposta é a Empresa A, pois o seu o seu Índice de Liquidez Corrente (ILC) é maior.

Quatro regras muito importantes:

  • ILC 1 → Empresa saudável.
  • ILC 1 → Empresa em situação preocupante.
  • Quanto maior que 1 for o índice de liquidez corrente de uma empresa, menores as chances de ela ficar inadimplente.
  • Quanto menor que 1 for o índice de liquidez corrente de uma empresa, maiores as chances de ela ficar inadimplente. 

Mas, muito cuidado para não considerar o Índice de Liquidez Corrente como um indicador absoluto da saúde financeira de uma empresa. O Índice de Liquidez Corrente nada nos diz sobre a qualidade dos ativos que constam no ativo circulante das empresas, entendendo qualidade como a rapidez para transformar os ativos em dinheiro. Em outras palavras, O Índice de Liquidez Corrente não fornece nenhuma informação sobre o “paralelismo” entre recebimentos e pagamentos.

Do lado dos recebimentos, o ILC não consegue responder algumas perguntas como: (1) O estoque poderá ser transformado em dinheiro nos próximos 12 meses? (2) O estoque poderá ser transformado em dinheiro pelo valor que consta no balanço nos próximos 12 meses? (3) O “contas a receber” está composto por créditos saudáveis, ou seja, aqueles que devem para a empresa honrarão seus compromissos em tempo e forma?

Do lado dos pagamentos, temos que a empresa tem que pagar os salários dos funcionários todo dia primeiro de cada mês, assim como impostos, conta de consumo regulares e fornecedores em datas específicas. Mas o ILC não consegue nos dizer se empresa conseguirá transformar seus ativos circulantes em dinheiro para honrar os seus compromissos.

Assim, embora o ILC nos dê alguma informação sobre a saúde da empresa, essa informação ainda é incompleta e insuficiente. Para “tentar” responder às perguntas não endereçadas pelo ILC, o mundo da contabilidade financeira desenvolveu outros dois índices: Índice de Liquidez Seca e o Índice de Liquidez Imediata

Vejamos cada um deles.

O Índice de Liquidez Seca se diferencia do Índice de Liquidez Corrente pois subtrai do ativo circulante o valor do estoque.

Analisemos, agora, o Índice de Liquidez Seca das empresas A e B.

A leitura dos Índices de Liquidez Seca das empresas A e B é a seguinte:

Empresa A → Para cada R$ 1,00 de passivo a vencer nos próximos 12 meses, ela tem R$ 0.94 de dinheiro e contas a receber para fazer frente.

Empresa B → Para cada R$ 1,00 de passivo a vencer nos próximos 12 meses, ela tem R$ 0.35 de dinheiro e contas a receber para fazer frente.

Usando como referência o Índice de Liquidez Seca, temos que ambas empresas encontram-se em situação financeira preocupante, pois nenhuma delas possui reais suficientes para honrar 100% dos seus compromissos de curto prazo.

O Índice de Liquidez Imediata, por sua vez, se diferencia do Índice de Liquidez Seca pois subtrai tanto do estoque como as contas a receber.

Analisemos, agora, o Índice de Liquidez Seca das empresas A e B.

A leitura dos Índices de Liquidez Imediata das empresas A e B é a seguinte:

Empresa A → Para cada R$ 1,00 de passivo a vencer nos próximos 12 meses, ela tem R$ 0.55 de dinheiro e contas a receber para fazer frente.

Empresa B → Para cada R$ 1,00 de passivo a vencer nos próximos 12 meses, ela tem R$ 0.20 de dinheiro e contas a receber para fazer frente.

Ao adicionar Índice de Liquidez Imediata na análise, a conclusão é a de que ambas as empresas se encontram em situação financeira ainda mais preocupante.

Filosofemos um pouco: No dia a dia é muito difícil ter acesso aos Índices de Liquidez da imensa maioria das empresas, dado que suas informações, normalmente, estão defasadas no tempo. Isso quer dizer que essas informações podem ser de 3 a 6 meses atrás.

Mesmo para o pequeníssimo número de empresas que têm “balanços” atualizados, o desafio é saber se as informações são fidedignas? São comuns casos de grandes empresas tidas como saudáveis, mas que eventualmente relevam demonstrações financeiras fraudulentas, mesmo tendo sido auditadas pelas maiores empresas de auditoria do mundo. Assim, a realidade pode se revelar bem mais complexa que a teoria.

De qualquer forma, conhecer essas informações pode ser muito útil para auxiliar na tomada de decisões que envolvam entregar o seu dinheiro a uma empresa que lhe devolverá (ou não) no futuro. Nesse caso, alguma informação é muito melhor do que a total ignorância.

Nino Reppucci é engenheiro civil com MBA em finanças corporativas.

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Uma resposta

  1. Parabéns pelo conteúdo bem estruturado e didático! A inclusão de exemplos fictícios foi um grande acerto, pois facilita muito a compreensão dos conceitos e a aplicação prática dos indicadores financeiros. Para tornar o material ainda mais completo, talvez valha a pena explorar brevemente como esses indicadores variam entre setores da economia, já que benchmarks podem mudar bastante conforme o ramo de atuação.

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